Faleceu na última segunda-feira (30/03), aos 97 anos de idade, vítima de uma infecção e uma gastroenterite, o herói nacional grego Manolis Glezos.
Glezos nasceu em 1922, na ilha de Naxos, no Mar Egeu. Aos 12 anos mudou-se para Atenas, onde conheceria e se filiaria à Juventude Antifascista. Aos 18 anos, na madrugada do dia 30 para o dia 31 de maio de 1941, numa Grécia ocupada pelas tropas alemãs, entraria para a História ao desafiar junto com seu amigo, Apóstolos Santas, de 19 anos, o poder do fascismo invadindo a Acrópole de Atenas, escalando a construção, arrancando a bandeira nazista pendurada no alto e substituindo-a pela bandeira de seu país. Este ato de rebeldia se tornaria inspiração para muitos outros na luta contra os regimes fascistas mundo afora e Glezos seria reconhecido por Charles De Gaule como “o primeiro resistente europeu”.
Glezos e Santas contariam depois que quando saíram do local deram de cara com um policial grego que chegou a questioná-los por estarem na rua em evidente desrespeito ao toque de recolher imposto pelos ocupantes, conferiu seus documentos, mas liberou-os. Aquele fora o primeiro ato de resistência no Sul da Europa. Logo foram condenados à morte sob a acusação de rebeldia, mas a sorte os livraria do destino decidido em um julgamento ocorrido à revelia: chegaram a ser presos por engano em março de 1942, mas a polícia não os reconheceu e por isso foram soltos um mês depois.
Até o fim da ocupação nazista seria preso várias vezes e na última dessas prisões (1944), fugiria. A essa altura, seu irmão mais novo, Nikos, já havia sido executado pelos nazistas.
Entre as décadas de 50 e 60, foi condenado à morte mais duas vezes por sua militância no partido comunista (KKE). A última condenação foi comutada em uma pena de prisão perpétua, que cumpriu por 12 anos.
A partir de abril de 1967, quando agentes do Vaticano financiaram o golpe de Estado que iniciou a Ditadura dos Coronéis – que perdurou até 1974 – Glezos tornou-se uma das principais lideranças da resistência. Por isso, foi detido e exilado por quatro anos nas ilhas-presídio do Mar Egeu.
Já em 1984, período em que a Esquerda Democrática (EDA) colaborava com o movimento socialista Pasok, Glezos foi eleito deputado e eurodeputado. Dois anos mais tarde iniciaria uma experiência ousada: ao ser eleito Presidente do Conselho Municipal de Apirathos, em Naxos, tentou estabelecer um sistema de Democracia Direta.
Posteriormente, Glezos seguiu a vida sempre atuando politicamente, como dirigente partidário, parlamentar e escritor. Já neste século, em meio à crise econômica e a consequente radicalização do ambiente político grego, não se escondeu: participou dos protestos contra as medidas de austeridade e pelo pagamento do empréstimo compulsório feito pela Grécia à Alemanha durante o regime nazista (avaliado em 2012 como equivalente a 7 bilhões de euros, pelo parlamento alemão, mas que o parlamento grego estipula em 11 bilhões de euros), chegando a ser atingido e prejudicado por gás lacrimogêneo utilizado pela polícia.
Na contramão da ascensão da direita, foi novamente alçado a símbolo de resistência, sendo eleito eurodeputado e, posteriormente, chegou a assumir o vice-Ministério para Assuntos Europeus, posição à qual renunciou por divergências com o governo de Alexis Tsipras.
Em 2017, mais uma vez serviu como porta-voz da racionalidade ao apoiar um embaixador alemão que participava da cerimônia em homenagem às vítimas gregas de um massacre nazista: Ao ver os presentes vaiarem o diplomata, Glezos tomou o embaixador pelas mãos e declarou que “o filho de um criminoso, quaisquer que sejam os crimes de seu pai ou mãe, não é responsável”.
Num momento de nova ofensiva de inspirações e práticas fascistóides em governos de diversos países, sua morte será sentida por aquelas e aqueles que lutam por um mundo livre do fascismo, face mais cruel da sociedade de classes que conhecemos até hoje. Perdurará, no entanto, o exemplo de quem jamais se permitiu o engano de ignorar os princípios de humanidade para lidar com fascistas.